Questão: Inquilino está no imóvel há 5 anos, lugar onde instituiu clínica e moradia. O contrato de locação foi feito somente no primeiro e segundo ano, com validade de um ano em cada um deles. Durante todo o tempo – 5 anos – o aluguel foi pago normalmente, e os recibos guardados.
O proprietário do imóvel faleceu, e os sucessores recusam-se a estabelecer contrato de locação, visto que tem intenção de vender o imóvel.
Qual a situação do Inquilino?
Pois bem, a Locação é um contrato particular regido pela Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato) e, subsidiariamente, pelo Código Civil.
Olhar a Lei específica, quando ela existe, é o ponto de partida na análise de qualquer caso.
No caso em tela, temos um contrato por tempo determinado (contrato individuais feitos nos primeiros anos), e, após a renovação tácita da locação, temos contrato por prazo indeterminado.
Lembrando que contrato não significa dizer que há um papel escrito. Este ainda é o melhor jeito de fazê-los, mas acordos verbais e comportamentos também fazem contrato entre as partes.
A própria lei do Inquilinato prevê essa situação em seu artigo 46/47 e 56, dizendo que locações com prazo terminam na data estipulada (validade do contrato no segundo ano), mas, caso o locatário permaneça no imóvel por mais 30 dias, presume-se a prorrogação da locação por prazo indeterminado. A disposição é a mesma quer o imóvel tenha uso residencial ou comercial.
Chegamos então à situação atual do inquilino: ele tem um contrato de locação por prazo indeterminado.
No mesmo art. 46, descobre-se que, nesse caso, o proprietário pode requerer o imóvel a qualquer tempo, desde que notifique o Inquilino com 30 dias de antecedência.
Ok, mas o proprietário está morto!
Então vejamos: o art. 10: “ morrendo o locador, a locação transmite-se aos herdeiros”. Não é necessário esperar pela abertura de inventário, nem pela conseqüente determinação do inventariante. É automático, os herdeiros passam a administrar, em conjunto, a locação.
Para o inquilino, isto é o que importa. Qualquer desavença entre os herdeiros-locatários será problema deles, discutido na ação de inventário (por exemplo, o desvio da renda da locação em proveito de apenas um herdeiro).
A locação, então, continua normalmente.
Caso os herdeiros, mediante notificação, requeiram o imóvel, caberá ao locatário entregar ou não a posse da propriedade.
E aqui cabe um parênteses: não se confunde – jamais! – a posse com a propriedade. Na locação de imóvel, o locatário tem a posse do imóvel, e só é possível entrar no imóvel com autorização do mesmo. Somente um juiz poderá dizer o contrário.
Na prática, vale dizer que o locatário tem todo o direito de não permitir a entra do(s) proprietário(s), nem mesmo de um corretor que tenha sido chamado (pelos proprietários) para avaliar o imóvel, ou qualquer situação do gênero.
Decidindo o locatário por não entregar o imóvel, o locador deverá entrar com ação de despejo (arts. 59 - 66).
No presente caso, não caberá defesa ao locatário (no sentido de que ele não está acobertado juridicamente). Indo a juízo, deverá manifestar sua concordância com a desocupação no prazo da contestação; nesse caso, o juiz fixará o prazo de 6 meses ( a partir da data da citação) para saída. Deixando o imóvel dentro do prazo estipulado, o réu/locatário ficará isento das custas e condenação em honorários advocatícios (ver art. 61). A lei prevê essa isenção de responsabilidade como forma de incentivar a solução “amigável”, sem uso de força bruta para o despejo.
A título de estudo, cabe falar também
Em caso de locação para uso comercial do imóvel, há a possibilidade da referida ação, que consiste em obrigar o locatário a renovar o aluguel.
A idéia desta ação é proteger o comerciante que, investindo no imóvel durante anos, atraindo clientela e estabelecendo ponto comercial, não deve ficar a mercê de retomada injustificada do imóvel.
O direito a renovação é disposição legal cogente, o que significa que não é possível que as partes instituam clausula contrária ao direito, sendo a mesma considerada nula.
Na situação apresentada, não cabe invocar esse direito.
O art. 51 determina os requisitos da ação: contrato escrito com prazo determinado não inferior a 5 anos e exercício no mesmo ramo há 3 anos.
Feita toda a análise do caso, fica a lição: contratos que são importantes para a nossa vida devem sempre ser escritos. E depois, lidos com atenção. Sendo contratos entre particulares, há opção de diálogo (não é contrato de adesão, como nos bancos e financeiras); converse, pergunte, peça para mudar a forma de escrever e deixá-lo mais claro (Abaixo o juridiquês!) e, se não concordar, exclua ou mude as cláusulas.
"Bom negócio" deve ser bom para ambas as partes, e não dá pra saber se é bom se não for claro e detalhado. E mais, a lei (quase sempre) protege os previdentes. Já dizia o ditado: “o direito não protege os que dormem” (dormentientibus non sucurrit jus, em latim).
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